quinta-feira, 10 de junho de 2010

Comissário europeu desconhece reformas portuguesas

O senhor Olli Rehn, comissário europeu dos Assuntos Económicos, revelou na passada 2ª feira um profundo desconhecimento das recentes reformas portuguesas, em matéria de segurança social e de pensões, consabidamente indexadas a um conjunto de medidas que têm em conta os aumentos da esperança de vida, de acordo com índices dos mais relevantes institutos europeus.
É bem certo que Olli Rehn teve de conceder, na linha do apurado pelos ministros das finanças do Eurogrupo, que Portugal definiu “objectivos apropriados visando a consolidação orçamental” e teve mesmo de qualificar como “corajosas e adequadas” as medidas adoptadas para lograr atingir os objectivos fixados.
Não obstante, o citado comissário europeu dos Assuntos Económicos persistiu em reclamar, de forma exigente e ainda mais rigorosa, a continuação das medidas em matéria de pensões e em sede laboral, qualificando de igual modo os casos espanhol e português e fingindo esquecer que a idade de reforma em França ainda continua a pautar-se pelos 60 anos.
É bem verdade que, logo na 3ªfeira, após perceber a reacção forte dos ministros portugueses da Presidência, da Economia e do Trabalho e Segurança Social, Olli Rehn apressou-se a reconhecer a incorrecção das suas palavras sobre Portugal. Confrontado com a realidade, teve de admitir o relevante trabalho do governo português em matéria de reforma sustentável da segurança social, atribuindo os seus lapsos à circunstância de “ter metido no mesmo saco” os dois países ibéricos, sabendo-se que, quer em matéria de segurança social quer em sede de relações laborais, as reformas verificadas em Portugal vão bem mais adiante que as tímidas reformas realizadas na matéria, pelo vizinho espanhol.
O Comissário Europeu desconhece, ou finge desconhecer, que a reforma da segurança social realizada recentemente em Portugal “colocou o sistema de pensões português como o segundo melhor do ponto de vista do impacto nas contas públicas “, de acordo com as palavras do ministro da Presidência, Silva Pereira. O que vale por dizer que o sistema de segurança social nacional está a contribuir decisivamente, nos seus resultados, para a efectiva sustentabilidade das contas públicas.
E mesmo no que toca às excessivas recomendações e exigências do comissário de Assuntos Europeus em matéria laboral, Olli Rehn viu-se prontamente desmentido por membros do governo português, já que Silva Pereira salientou que Portugal foi “de entre os países da OCDE o que mais evoluiu ao nível da rigidez da sua legislação laboral”, o que acrescendo às frontais reacções do anterior ministro do trabalho, Vieira da Silva, e da actual ministra da pasta, Helena André, sempre no sentido de que o senhor Olli Rehn desconheceria as “reformas profundas no sistema de pensões e em matéria laboral”, fez com que o Comissário, interpelado por jornalistas portugueses na passada 3ª feira, viesse a recuar sobre os próprios passos e a reconhecer que, afinal, a Espanha é que deveria seguir o exemplo de Portugal…
Se tais matérias aqui se trazem, é apenas para salientar a confusão de que vão dando mostras muitos dos responsáveis do Eurogrupo e da União Europeia, significativamente os mesmos que se retraíram e atrasaram no apoio financeiro à Grécia e reagiram a destempo à ofensiva especulativa contra o Euro.
Por outro lado, não deixa de ser sintomática a coincidência de as primeiras declarações de Olli Rehn terem sucedido, em apenas um dia, a declarações do líder do PSD, Passos Coelho, de teor muito semelhante, designadamente em sede laboral. De facto, falar da liberalização dos despedimentos, ao domingo, em Portugal, por vezes origina declarações como as de Olli Rehn, no dia seguinte, no Luxemburgo.
Já vai sendo tempo de o principal líder da oposição entender que não pode fazer acordos internos com o governo, num dia, e no dia seguinte atiçar incêndios que os dirigentes europeus, de forma cabotina e descabelada, aproveitam para continuar a exigir cada vez mais sacrifícios aos países mais pequenos em detrimento dos que também devem exigir aos de grande dimensão.
Por último, que fique claro, são os portugueses e os seus órgãos legítimos de representação e de governo que decidem das medidas a tomar por Portugal.
Também por isso se devem considerar, além de asnáticas, verdadeiramente abusivas, as pressões originariamente produzidas pelo comissário dos Assuntos Económicos, mesmo que posteriormente desmentidas. Tudo razões para que o governo português tenha andado muito bem ao rejeitar e corrigir os alegados lapsos do citado Comissário.


Osvaldo Castro

(publicado no Jornal de Leiria de 10 de Junho de 2010)

5 comentários:

Ana Brito disse...

Caro Osvaldo
Excelente artigo: claro, lúcido, inteligente, elucidativo - Parabéns.
Quanto ao Senhor Rehn apetece dizer que às vezes parece fácil, como se o espírito fosse uma lanterna mágica,projectar as suas imagens sobre o pano de fundo que não é a realidade e querer ver coisas pressupostamente conhecidas no desconhecido.
Os erros cometem-se, mas a correcção fica bem e é bom afirmar, também, que os portugueses são portugueses e não são, por exemplo, espanhóis diferentes, como diria Boaventura Sousa Santos.
Um Abraço Amigo
Ana Brito

Carta a Garcia disse...

Cara Ana Brito,

Muito obrigado pelas S/ palavras.Cada vez mais devemos estar atentos às "gaffes" de certos dirigentes europeus que,no fundo visam amesquinhar o país e contribuír para o seu desprestígio em termos económicos internacionais.Claro que recentes declarações de Cavaco Silva ("país insustentável") também não ajudam nada...
Abraço Amigo.

Ana Paula Fitas disse...

Caro amigo Osvaldo Castro,
Fiz link deste e de outro texto na rubrica Leituras Cruzadas, lá, no A Nossa Candeia :)
Obrigado.
Um grande abraço.

Miguel Gomes Coelho disse...

Perfeito.
Um abraço.

Carta a Garcia disse...

Meus Caros Ana Paula Fitas e TMike(Miguel Gomes Coelho),

Um abraço pela V/ atenção e referência ao "A Carta a Garcia",

com estima,

OC