Há prioridades na perseguição penal? Só uma sociedade sem hierarquia de valores pode dar resposta negativa. A Constituição e a lei, apesar de basearem a atividade das magistraturas e das polícias no princípio da legalidade, estabelecem uma escala de crimes e penas que revela que há bens cuja proteção é prioritária, como a vida, a integridade ou a liberdade.
Por outro lado, se não forem consagradas pela lei, segundo critérios de interesse comum, e aceitáveis com um amplo consenso, as prioridades acabarão por ser estabelecidas, na prática,de modo informal. Nesse caso, as prioridades serão ditadas por rotinas, interesses profissionais ou estímulos exteriores, como a influência política ou a repercussão mediática.
Porém, tal definição de critérios, alheia a uma lei democrática de política criminal, é ilegítima. Na verdade, não podem ser os interesses particulares a definir as prioridades da política criminal ou o modo de atuação das autoridades penais. Se isso acontecer, pode concluir-se que uma função do Estado terá sido tomada por interesses que lhe são estranhos.
No passado, por exemplo, os crimes de maus tratos e violência doméstica, abuso sexual, corrupção e ambientais não constituíam prioridades da política criminal, sendo até tolerados pela sociedade e pelo poder político. Hoje, pelo contrário, reconhece-se consensualmente que eles põem em causa valores essenciais do Estado de Direito democrático.
Apesar da sua diversidade, todos esses crimes se confrontam com a intolerância do Estado quanto ao exercício de poderes ilegítimos sobre pessoas ou bens públicos, anulando direitos fundamentais. Mas tais prioridades não invalidam que, numa sociedade baseada na essencial dignidade da pessoa, a preservação da própria pessoa seja a primeira prioridade.
O crime de homicídio nunca pode ser banalizado, mesmo que tenha escasso impacto político, e o desaparecimento de pessoas jamais pode ser desvalorizado. Dói ver o mapa de homicídios que este jornal publica on-line, cujos números merecem análise atenta. A sucessão de homicídios em casos de desagregação familiar ou conflito quotidiano é preocupante.
Tais casos indiciam um apagamento das contramotivações morais, com que a política criminal se deve ocupar, mesmo que esteja em causa, sobretudo, a intervenção social e não tanto a ação de polícia. Tal como diz Camus, em ‘O Homem Revoltado’: "Quando Caim matou Abel fugiu para o deserto. E se os assassinos constituem multidão, a multidão vive no deserto."
Por outro lado, se não forem consagradas pela lei, segundo critérios de interesse comum, e aceitáveis com um amplo consenso, as prioridades acabarão por ser estabelecidas, na prática,de modo informal. Nesse caso, as prioridades serão ditadas por rotinas, interesses profissionais ou estímulos exteriores, como a influência política ou a repercussão mediática.
Porém, tal definição de critérios, alheia a uma lei democrática de política criminal, é ilegítima. Na verdade, não podem ser os interesses particulares a definir as prioridades da política criminal ou o modo de atuação das autoridades penais. Se isso acontecer, pode concluir-se que uma função do Estado terá sido tomada por interesses que lhe são estranhos.
No passado, por exemplo, os crimes de maus tratos e violência doméstica, abuso sexual, corrupção e ambientais não constituíam prioridades da política criminal, sendo até tolerados pela sociedade e pelo poder político. Hoje, pelo contrário, reconhece-se consensualmente que eles põem em causa valores essenciais do Estado de Direito democrático.
Apesar da sua diversidade, todos esses crimes se confrontam com a intolerância do Estado quanto ao exercício de poderes ilegítimos sobre pessoas ou bens públicos, anulando direitos fundamentais. Mas tais prioridades não invalidam que, numa sociedade baseada na essencial dignidade da pessoa, a preservação da própria pessoa seja a primeira prioridade.
O crime de homicídio nunca pode ser banalizado, mesmo que tenha escasso impacto político, e o desaparecimento de pessoas jamais pode ser desvalorizado. Dói ver o mapa de homicídios que este jornal publica on-line, cujos números merecem análise atenta. A sucessão de homicídios em casos de desagregação familiar ou conflito quotidiano é preocupante.
Tais casos indiciam um apagamento das contramotivações morais, com que a política criminal se deve ocupar, mesmo que esteja em causa, sobretudo, a intervenção social e não tanto a ação de polícia. Tal como diz Camus, em ‘O Homem Revoltado’: "Quando Caim matou Abel fugiu para o deserto. E se os assassinos constituem multidão, a multidão vive no deserto."
Por:Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal, com a devida vénia.Publicado hoje no Correio da Manhã, a quem se agradece.
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