A justiça americana debate-se, presentemente, com dois relatórios psiquiátricos contraditórios acerca da questão da imputabilidade de Renato Seabra: um, apresentado pela defesa, pretende que ele não tinha capacidade mental para compreender o que fazia quando matou Carlos Castro; o outro, entregue pela procuradoria de Nova Iorque, sustenta o contrário.
Um tribunal português também pode ser confrontado com perícias contraditórias. Assim aconteceu no caso de Osso da Baleia, em 1987, quando um bancário de 38 anos matou sete pessoas, incluindo mulher e filha, sem explicação plausível. Mas é o tribunal que tem a última palavra sobre a imputabilidade, embora deva justificar a divergência quanto às perícias.
Uma responsabilidade penal que não ficcione a pessoa não pode prescindir de critérios de diferenciação entre as situações emocionais vividas pelos agentes. Ainda na semana passada a Faculdade de Direito de Lisboa organizou um colóquio internacional que versou sobre emoções e crime, promovendo um estimulante diálogo entre Ciência, Filosofia e Direito.
A Ciência investiga se os comportamentos são determinados por estados de consciência, que devem fornecer o substrato da responsabilidade ética e jurídica. Mas uma influência unilateral da neurociência no pensamento jurídico potencia o regresso à escola positiva, com prevalência de uma prevenção especial autoritária e sem esperança na regeneração.
O discurso científico tem questionado se é possível descrever como causal a relação entre consciência e ação. Várias experiências analisadas por Benjamin Libet põem em causa essa possibilidade, favorecendo a tese de os comportamentos ditos voluntários surgirem a partir de impulsos neuronais anteriores em milésimos de segundo aos estados de consciência.
Esta ideia suscita a dúvida sobre se o momento da consciência é determinante da ação ou apenas um acontecimento concomitante que se apropria dela. Assim, em casos como o homicídio de Carlos Castro, será muito importante saber se existiu o fenómeno a que chamamos consciência? E poderemos, aliás, concluí-lo a partir da história construída pela prova?
A invocação da consciência pode significar apenas que o agente pôs em movimento motivos e razões que não tiveram a oposição do respeito pela vida alheia. Resta saber, então, se o acusado ainda dispõe de argumentos para demonstrar que tal descontrolo tem a seu favor uma razão que mitiga a culpa. Por isso, ele terá de ser ouvido antes do julgamento definitivo.
Por:Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal,com a devida vénia.Publicado no Correio da Manhã.
Um tribunal português também pode ser confrontado com perícias contraditórias. Assim aconteceu no caso de Osso da Baleia, em 1987, quando um bancário de 38 anos matou sete pessoas, incluindo mulher e filha, sem explicação plausível. Mas é o tribunal que tem a última palavra sobre a imputabilidade, embora deva justificar a divergência quanto às perícias.
Uma responsabilidade penal que não ficcione a pessoa não pode prescindir de critérios de diferenciação entre as situações emocionais vividas pelos agentes. Ainda na semana passada a Faculdade de Direito de Lisboa organizou um colóquio internacional que versou sobre emoções e crime, promovendo um estimulante diálogo entre Ciência, Filosofia e Direito.
A Ciência investiga se os comportamentos são determinados por estados de consciência, que devem fornecer o substrato da responsabilidade ética e jurídica. Mas uma influência unilateral da neurociência no pensamento jurídico potencia o regresso à escola positiva, com prevalência de uma prevenção especial autoritária e sem esperança na regeneração.
O discurso científico tem questionado se é possível descrever como causal a relação entre consciência e ação. Várias experiências analisadas por Benjamin Libet põem em causa essa possibilidade, favorecendo a tese de os comportamentos ditos voluntários surgirem a partir de impulsos neuronais anteriores em milésimos de segundo aos estados de consciência.
Esta ideia suscita a dúvida sobre se o momento da consciência é determinante da ação ou apenas um acontecimento concomitante que se apropria dela. Assim, em casos como o homicídio de Carlos Castro, será muito importante saber se existiu o fenómeno a que chamamos consciência? E poderemos, aliás, concluí-lo a partir da história construída pela prova?
A invocação da consciência pode significar apenas que o agente pôs em movimento motivos e razões que não tiveram a oposição do respeito pela vida alheia. Resta saber, então, se o acusado ainda dispõe de argumentos para demonstrar que tal descontrolo tem a seu favor uma razão que mitiga a culpa. Por isso, ele terá de ser ouvido antes do julgamento definitivo.
Por:Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal,com a devida vénia.Publicado no Correio da Manhã.
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